José e Pilar

Não tenho a pretensão de fazer nenhuma análise inteligente, consistente ou convincente deste belíssimo documentário, apenas não posso deixar de registrar a multidão de sentimentos que me invadiram enquanto eu o assistia. Como poucos, este filme me tocou profundamente e esta comoção se deve ao fato de que as reflexões contidas nesta obra provém não de um personagem fictício, maquiado pela fantasia da imaginação, mas de um ser humano como nós, feito de carne e osso. No caso, realista, demasiadamente realista, e consciente daquilo que a maioria ignora.
O filme é bem claro ao mostrar que, mesmo debilitado, Saramago não negava autógrafos e nem protestava diante da rotina a qual era subjugado. Pilar, sua esposa, mais parecia ter nervos de aço. Minha impressão é que ela atuava como uma força impulsionadora na vida de Saramago, ao ponto dele admirar-se e tecer comentários acerca da confiança em que ela depositara no futuro. Ele, já mais consciente do fim e quase despedindo-se da vida, parecia ter outra postura. A verdade é que ele não tinha mais tempo a perder e, apesar da serenidade de monge advinda com maturidade dos anos, Saramargo não poupava respostas argutas, sóbrias e cheias de assertividade para com as antas que lhe insistiam em roubar-lhe a paz de seus preciosos minutos com perguntas requentadas ou capciosas. Longe de tirar-lhe a simpatia, esse traço de caráter lhe conferia ainda mais autenticidade, revelando também um verdadeiro mestre na arte da “esgrima” com palavras.
Mesmo arrefecendo diante da vida, Saramago enfrentava com resignação todo aquele mar de compromissos. E enquanto as águas dos dias corriam e se avolumavam sem dó nem piedade, Saramago parecia afundar-se cada dia mais em sua contida, mas lúcida desesperança entre “estar e já não estar”. Ao procurar decifrar a beleza da dor que lhe inquietava a alma, Saramago procurava não cair na tentação de romantizar os fatos, bem como o iminente fim: uma espécie de afogamento rumo ao mar do esquecimento. Em sua luta para não poetizar a morte e nem a vida, ele invejava as árvores. Sob sua ótica, as árvores tinham uma aura de perenidade com raízes que lhe conferiam algum tipo esperança e vitória sobre a fugacidade da vida.
Pois bem, o que mais haveria de querer àquele quem já tinha conquistado tudo o que muitos mortais nem ousaram sonhar? O que mais haveria de pedir àquele que já tinha razoavelmente tudo o que a vida pôde oferecer? Quando questionado exatamente acerca disso, Saramargo atira seu mais belo dardo e, sem titubear, diz mais ou menos assim: “TEMPO. Tempo para continuar a vida, continuar a escrever, continuar a respirar...”. Embora sucintas, essas palavras me soaram pesadas e, com certeza, fruto de quem muito se debateu diante de sua impotência. Ele simplesmente daria tudo por aquilo que eu e você temos de sobra!
Saramago me fez respirar aliviada ao me dar conta de que quem estava na pele dele era ele e não eu, que havia me fundido à ele durante o filme. Saramago me fez pensar no quanto é maravilhoso poder respirar por respirar, ver quem você ama respirar e pronunciar com a certeza de quem vive, o nome do seu amor!!!
É realmente importante termos sempre a consciência de que com o tempo não se brinca. Ai, de quem desperdiçar a vida sem amar exclusivamente e se deixar ser exclusivamente amado! Ai, de quem desperdiçar a vida com prazeres baratos, sem nunca alcançar o poder libertador de um coração reto e puro diante de Deus! Ai, daqueles que esperarão a velhice ou alguma circunstância drástica da vida lhes ensinarem o valor de tudo o que os cerca.
“É por isso que vivemos dias tão efêmeros;
matamos o tempo, e o tempo nos enterra,
apanha e devora tudo o que amamos.
É a vida que, aos poucos se gasta;
e que, gasta de tanto se acostumar,
se perde de si mesma...” (Monique).
É realmente importante termos sempre a consciência de que com o tempo não se brinca. Ai, de quem desperdiçar a vida sem amar exclusivamente e se deixar ser exclusivamente amado! Ai, de quem desperdiçar a vida com prazeres baratos, sem nunca alcançar o poder libertador de um coração reto e puro diante de Deus! Ai, daqueles que esperarão a velhice ou alguma circunstância drástica da vida lhes ensinarem o valor de tudo o que os cerca.
“É por isso que vivemos dias tão efêmeros;
matamos o tempo, e o tempo nos enterra,
apanha e devora tudo o que amamos.
É a vida que, aos poucos se gasta;
e que, gasta de tanto se acostumar,
se perde de si mesma...” (Monique).
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