Sunday, January 06, 2008

Virtude e Prazer

A virtude é algo de alto, de sublime, de majestoso, de invencível, de ininterrupto: o prazer algo de baixo, de servil, de frágil, de louco, cujo lugar de parada e cujo domícilio são os prostíbulos e tavernas.

Encontrarás a virtude no templo, no fórum, na cúria, em pé ante os muros, coberta de pó, cozida pelo sol, com as mãos calosas; o prazer o encontrarás freqüentemente, escondido e na procura das trevas, ao redor dos banhos, nos meio de esquentamento e nos lugares que têm medo das guardas, fraco, enervado, banhado de vinho e de perfume, pálido, mascarado e coberto de pomadas.

O sumo bem é imortal, não vem menos, ignora a saciedade e o remorso: uma mente reta não volta para trás, não odeia nunca a si mesma e não muda nada na sua vida, que é a melhor; o prazer ao invés cessa, exatamente quanto goza em demasia, e não tem muito espaço: por isso se vai logo, vem o enjôo e se enfraquece depois do impulso.

Não pode nunca haver nada estável no que, por sua natureza, está em contínuo movimento, assim não se pode encontrar alguma consistência em tudo que vem e vai, rapidamente, e se consome no próprio uso; porque, isso que está assim estruturado alcança, enfim, a meta quando vem menos e, no instante mesmo, no qual começa, já haverá começado a exaurir-se.

Em primeiro lugar, não é para obter prazer que se busca a virtude: ela também procura o mesmo, mas não é este o seu corpo principal, embora olhando para o outro lado, a consiga. O prazer não é a recompensa, nem a causa da virtude, mas um acréscimo, não é também aceito porque alegra, mas se é aceito, alegra da mesma forma.

O sumo bem não sente a necessidade de algo mais. Tu perguntas o que eu procuro obter da virtude? A própria virtude. Nada há, de fato, melhor, ela é por si mesma a recompensa. Eu sustento que ninguém tem condições de viver, agradavelmente, se, ao mesmo tempo não vive, também, de modo honesto! E afirmo com absoluta clareza que se pode obter aquela vida que defino agradável somente pela virtude.

Mas quem a ignora, não é tolo o suficiente para afundar-se nos prazeres perversos? Entre os primeiros, a arrogância, a presunção e a soberba, que os fazem sentir superiores aos outros. Depois o amor cego e excessivo pelos próprios bens, o gozo sem medida e a exultação exagerada por coisas pueris e inúteis. Por fim, a dureza e o desprezo que se compraz em ofender, a inércia e a moleza de um ânimo fraco que dorme sobre si mesmo.

A virtude afasta tudo isso, puxa as orelhas aos prazeres e os valida antes de acolhê-los; não dá tanta importância àqueles que aceita, todavia faz um uso cauteloso e se compraz em praticá-los, não de gozá-los. E a temperança, desde o momento que reduz os prazeres, é talvez uma ofensa feita aos direitos do sumo bem?

Tu abraças o prazer, eu os ponho freio; tu gozas o prazer, eu me sirvo dele; tu o consideras sumo bem, eu nem um bem; tu fazes tudo pelo prazer, eu nada.

(Sêneca.)

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